sexta-feira, 28 de novembro de 2014

DIA PERFEITO



Como chegamos até aqui?
Era isso o que sonhávamos?
Hoje acordo pensando ser o dia perfeito. E ao cair da noite, quando as preocupações se dissipam em sonhos férteis, é a perfeição que acho?
Este caminho que não escolhi é talvez a senha para um futuro melhor. Mas quem poderá garantir? Dia após dia e as lembranças se apagam e depois tornam a ganhar vida. O passado se faz presente. Sinto como se presente e futuro fossem a mesma coisa, pois daquilo que planejei só me restam os sentimentos de algo melhor. O que tenho é bom, é ótimo. Mas será suficiente?
Que necessidade é essa de algo que não se tem ou não se pode ter?
Estas palavras que agora se juntam em pensamentos rápidos e talvez melancólicos, saudosistas, são parte de uma natureza selvagem, rude, porém afetuosa, que vê o mundo como um lugar bom pra se viver. Nada me tira a esperança de que desta vida só vou levar o carinho recebido por aqueles que cativei.
Sou tão indiferente aos passos alheios? Serei eu tão egoísta ao ponto de não perceber que dentro de outrem possa existir um coração? Penso que não.
Se fiz escolhas erradas, foram elas as minhas escolhas. E de nada mudaria, pois a caminhada tortuosa até aqui também se fez de bons momentos. E talvez mudar um passo possa me tirar coisas que prezo tanto.
Sou escravo da felicidade. Vivo para ela apesar de pensarem o contrário. A aparência de olhos tristes, esconde um sorriso largo e sincero que se põe tímido diante de um universo tão grande e complexo.
Amo. Amo demais essa sensação de desafio diário. Nunca ter tido uma vida considerada normal pela grande maioria me dá o poder de ser meu próprio desafiante a cada segundo. Preciso me superar. Recuar muitas vezes, mas sempre no intuito de dar um golpe fatal mais a frente.

Bom ser jovem e ter menos responsabilidade do que deveria. Mesmo parecendo ter passado por uma caminhada cheia de vitórias, são dos percalços que me lembro com mais carinho e atenção. São eles que me fizeram ter o olhar firme. Nada me escapa. E quando pensarem que desisti ou que estou semi-morto, é daí que surgirá  meu dia perfeito.

CONJUGADO

No andar de cima mora uma puta. Atende alguns clientes em casa. Inclusive eu. Ouço o ranger do pé da cama no assoalho, alguns suspiros e gemidos, o ofegar desesperado de quem quer saciar as necessidades mais primitivas, o choramingar de quem só quer uma companhia, de quem vive sozinho em um mundo conectado. Ela é uma agente social. Salva da amargura seres que só se relacionam através do dinheiro, que possuem uma dificuldade enorme em confiar em si mesmos. Confiam no poder do papel. Lá está ela para acariciá-los, elogiar, beijar, lamber, chupar, gritar, realizar fantasias, interpretar personagens. Tudo por 150 reais a hora. Corpo de academia. Rosto de Brasil. Pele de meio-dia na praia.
Ninguém me liga. Mãe não conta. Ela me liga para falar das dores. Da alma, peito, corpo. Diz que vai morrer cedo. Diz que meu pai não vale nada e que a deixou com um filho criança para cuidar sozinha. Diz que as pernas cheias de varizes doem cada dia mais, que as veias vão estourar a qualquer momento. Não diz que me ama. Depois de papai, não amou mais nada. Ou pelo menos não soube que amava, pois a existência dele a impedia de enxergar ou sentir qualquer coisa que não fosse angústia. Voltaria para ele quando ele quisesse. Nunca quis. E cresci nesse não querer. Meu nariz de batata é igual ao dele. Meu cabelo, meus olhos, só a boca é dela. Ela olha para mim e talvez sinta ódio. Ou não sinta nada. Mamãe é a única que me liga. Mas não liga muito para mim.
No fim do corredor do sexto andar deste prédio em Copacabana vive Dona Nelma. Após a morte do marido lhe sobraram a pensão e a vida que nunca teve. Antes enfurnada no apartamento, (sobre)vivendo para ele, para a comida que ele gostava, para a limpeza que ele apreciava, para o mau humor que ele exalava, para a insônia que nunca cessava, jogou fora tudo que imaginava. Hoje faz pilates, dança de salão e sexo. Cada atividade pelo menos uma vez na semana.
Na parede ao lado habitava um garoto de uns 21 anos. Veio fugido do pai no Mato Grosso. Era gay e não podia ser. Manchava o nome da família, dizia o pai. Não é meu filho, não pode ser. Não te criei pra isso. Não isso. Não aquilo. Não. Não. Veio corrido para não causar mais problemas na cidade onde morava. O pai bancou esse conjugado sem ventilação para se livrar da vergonha. Para os amigos disse que tinha mandado o filho pra ser doutor. Para si perguntava que sangue podre poderia ter contaminado o menino: o dele ou da esposa? O garoto chorava por amar o pai. A mãe chorava por não ter força. Queria o filho como ele era. Não pode, mulher! O que eu vou dizer pros outros? O garoto partiu de repente, assim como tinha chegado. Sem alardes. Era discreto. Ninguém mais o viu por aquelas bandas. Não houve despedida. Gostava de meninos? Sim. Mas também de Beatles, geleia de morango com torrada, Milan Kundera e correr na orla.
Na porta da frente um drogadinho metido a traficante. Ao lado a Dona Matilde, que cria 12 gatos. Abaixo de mim um gordo viciado em filme pornô. Todos em um cubículo que mal cabe uma pessoa. São raros os que vivem com mais alguém. Somos uma sociedade de solitários. Todos ligados pelo mesmo encanamento. Nossos restos se misturam e tomam o mesmo destino. Os encontros aconteciam no elevador, que fazia o mesmo trajeto e nos levava para planetas tão distantes.
Há dois dias eu sentia um cheiro estranho invadir o conjugado. Cada vez mais forte. Não havia quem se prontificasse a verificar o que era, de onde vinha, o porquê do cheiro. Acabamos nos acostumando a viver na merda mesmo. Mais um pouco não faz diferença. No quinto dia de mau cheiro, acordo com um estrondo bem perto de mim. A sensação era de que uma bomba havia atingido o prédio.
O conjugado ao lado foi arrombado pelos bombeiros. Meu sono pesado e o Lexotan impediram de ouvir as sirenes, que agora ocupavam todo o ambiente. Levaram o corpo do garoto de 21 anos. Ele estava lá todo esse tempo. Não falaram para nós o motivo da morte. Morreu de esquecimento.
Eu acordo, levanto, bebo água, volto a dormir, acordo, levanto, como alguma coisa, deito, olho o teto, pego no sono, não sonho, não ronco e ocupo apenas um canto da cama. Assim seguem os dias e noites, meio sem sentido, em um compasso fora de ritmo, porém constante.
Minha mãe me liga. Diz que sente saudade e que um dia virá me visitar. De vez em quando ela fala isso, mas nunca vem. Melhor assim. Diz também que meu pai ligou e perguntou por mim. Há 3 anos não falo com ele. Ela reclama da aposentadoria. Os remédios aumentaram. O plano de saúde está pela hora da morte. A carne está com um preço absurdo. Não dá pra comprar mais nada. Eu apenas concordo fazendo um grunhido sem sentido. Esqueceu de falar das varizes. No fim diz adeus. Antes de desligar: te amo.

Mamãe é a única que liga pra mim. Eu que não ligo pra nada.

PEDRO SILÊNCIO



Maria solta um último grito, de parcas forças. Maria silêncio. Maria na cama.
Pedro grita.
Quem grita anuncia vida. Silêncio é coisa de quem parte.
Pedro sem mãe. Sem pai. Sem chão.
Dão de comer a Pedro. Ele mama. Não sabe por que mama. Quer viver. Espanta a morte com o grito. Vive porque tem medo.
Todo ele cresce. Tudo nele parece maior a cada dia. Cresce de teimoso.
Pedro é bom de bola. Pedro é bom de escola. Pedro é bom.
Pedro cheio de sonhos. Mesmo que a Pedro não tenha sido ensinado sonhar. 
Sonha, Pedro.
Sabe que é difícil realizar. 
Quebra o muro, Pedro. É preciso atravessar.
Dribla a bola. Dribla a vida. Pedro é bom de bola. Pedro não está na escola. Foge pra não te pegar. Dribla o tempo. Só não dribla a história. Pedro é bom?
“Bandido bom, é bandido morto”. Pedro, preto, bandido? Morre, Pedro.
Vive, Pedro.
- Quero viver. Vivo pra seguir sonhando.
Sonha mais que vive. Nada na escuridão. Alcança a borda pra não se afogar.
Vive, Pedro. Sobrevive.
- Deixem-me viver!
O homem de farda não gosta de Pedro. Não gosta de preto. Pedro, preto, pobre, bandido?
Pedro não sabe viver. Só aprendeu a sonhar.
Deixa de sonho, Pedro. Isso vai te matar.
A bola que rola, Pedro sabe driblar. Olha o homem de farda, Pedro. Ele vai te matar.
Pedro é preto. É pobre.
Bandido? Bandido.
Os homens vão te julgar. Não adianta, Pedro. Esse mundo é seu inimigo. 
Então corre, Pedro. Corre que o mundo vem aí e passa por cima. Dribla a vida pra sobreviver. Dobra a esquina na contra-mão.
"Pega ladrão!"
Corre e pá.
Peito quente. Sangue escorrendo.
Pedro silêncio. Pedro no chão.



No Brasil, todos os anos, cerca de 30 mil jovens são assassinados. Desses, 77% são negros. Isso não é uma coincidência ou vitimização, é uma política de Estado.

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

O MEDO DE PERDER

Não sei se chamaria o amor de sentimento ou uma capacidade orgânica dos seres humanos. Amar é uma escolha, apesar de não se poder escolher a quem vamos amar. A partir do momento em que nos abrimos a deixá-lo entrar pela porta, sabemos que ele nos invadirá pela janela, pelas frestas, por caminhos que nem mesmo nós sabíamos da existência. Quem entrará? Não importa. Ao se permitir abrimos mão das escolhas. Há também os que optam por permanecer impávidos. Estes não afeitos a arroubos, rompantes, dosam as sensações que permitem passar. Não que este passe a ser um caminho mais fácil. Tampouco seria, pois todas as tentações e desvios estão disponíveis ao alcance das mãos. A vigilância permanente é a forma que encontram para não se sabotarem. Aliás, sabotar-se é um ato inerente aos dois tipos. Cada um ao seu modo.

Sou desses que escolheram amar. Sofro e me delicio com as consequências dessa posição. A dor é uma maneira de nos sentirmos vivos. Por mais que tentemos ser altruístas, o que queremos de verdade é a reciprocidade. Damos e queremos algo em troca. No desejo da correspondência acabamos moldando o “eu” que apresentamos. Sendo assim, quase sempre somos uma versão melhorada ou podada de nós mesmos. A começar pelos “perfis” de redes sociais, onde montamos um universo ideal de nosso dia a dia, gostos, rotinas, pensamentos e características. Transformar tudo aquilo em realidade é simplesmente irreal. Isto também não deixa de ser amor. O medo de perder. A permanente inércia que teima em não nos deixar mover, mudar. Se sabemos o que queremos ser, então por que não mudamos? Medo, medo, medo. Medo do esquecimento. Antes disso, o medo da solidão, que em nossos pesadelos se mostram carregados de um fim sem companhia.

Permaneço ao lado daqueles que seguem amando amar, pois não sabem outra forma de viver. Mudei, é verdade. O que fui permanece sendo eu. Tudo ainda sendo eu, pois está marcado nessa história que sigo escrevendo. Não há chance de uma borracha apagar qualquer linha.

Já traí e fui traído. Posso dizer: trair foi pior. A sensação de decepcionar as pessoas que você mais preza tem o poder de ferir e permanecer latejando por anos. Perdoar-se é tão difícil quanto seguir em frente. E uma coisa está diretamente ligada à outra.

A ânsia por acumular experiências, parceiras, como se travasse uma luta contra o tempo, que ia me engolindo e vencendo. Sentia-me em uma dívida constante. Sempre travado em relação a tudo: conhecimento, sexo, bens, viagens, vida.

Sofremos da saudade de quem perdemos o contato. Tentamos suprir com abraços e afagos virtuais, que acabam por não suprir nada. A correria a qual nos impusemos não só atrapalha, mas também trava. Quem nunca se viu sem saber por onde (re)começar? O eterno desejo de ter controle e perceber que na maior parte das vezes a sensação é que uma força maior nos controla e direciona. Seria o amor?

Algo muda em mim, no organismo e na alma, cada vez que vejo meu avô dar um sorriso simplesmente porque a mulher que ama está sentada ao seu lado. Ou quando meu pai chega em casa e seus olhos procuram por minha mãe. Percebo que fizemos a mesma escolha. Optamos pela queda livre em um abismo que não se vê o fundo. Chegaremos ao chão? Quando? Será que conseguiremos seguir vivendo com o frio na barriga da incerteza? Pois foi a isso que nos dispusemos. Amar é também se deixar perder e saber que ter vencido ao menos um dia já nos torna alguém melhor.

Sempre vale a pena. Amar fere, mas constrói.

05/11/2014


segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

DOIS LADOS


“Pra quê voltar se já sei o que não vou encontrar?” Abrir a porta do apartamento ao voltar do trabalho tinha sido seu pesadelo durante todo o dia. Ela não estaria mais lá. A despedida tinha acontecido naquela manhã, antes que ele saísse. “Nem teve a compaixão de partir quando eu não estivesse”, pensou. Melhor assim. Talvez pensasse que tudo continuaria igual, pois não teria havido despedida. O corte, a ruptura crua e clara era dolorosa, porém traria o alento da verdade. Encarar a realidade é melhor do que os prolongamentos angustiantes da ilusão.

Marcelo não era o melhor homem com quem Luísa havia estado. Não se assemelhava nem a Alberto em seus melhores tempos, mas tinha no olhar um desejo por ela, que a fazia sentir quando aos 20 anos de idade, passava de propósito pelos corredores da faculdade em seus vestidos curtos de tecido leve e solto sobre a pele morena e sentia cada olhar masculino a desviar-se de qualquer tarefa para apreciá-la. Aqueles olhares apagavam a adolescência sem graça, quando ainda magra, só tinha a atenção de um homem que quisesse se aproximar de suas amigas. O amante agora a fazia sentir o eriçar de pêlos na nuca da juventude. Sua feminilidade reacendida pelo retorno da auto-apreciação.

Alberto era solar, mas só via noite a sua frente. Lembrava do pedido de namoro. Pedido que ela recusou, mas que dois dias depois aceitou. Pensava no primeiro “eu te amo”, mesmo que hesitante, porém sincero, dito enquanto faziam sexo bêbados. A declaração teve que ser feita novamente no dia seguinte para que ela aceitasse o efeito. Não queria que parecesse tudo desculpa da bebida. Disse “eu te amo” a ele também e sentiu o coração acelerado enquanto o abraçava com a cabeça recostada sobre o peito dele.

Luísa sentia uma mão tocar sua perna e pressionar levemente a coxa direita, um arrepio que vinha da base da coluna à nuca. De olhos fechados se permitia sentir aquilo sem quebrar qualquer encanto. As buzinas a estourar seus tímpanos a fizeram voltar. Estava dentro do carro. Sinal verde e ela a relembrar a tarde anterior.

De tão só se perdia de si. Como um cego novato a tatear o mundo no escuro em busca de algo que reconheça. Sem rumo, reaprendendo a caminhar sozinho. Vivia com ela e para ela. Esquecera como tinha sido antes. Existia antes? Acomodou-se na tranqüilidade do matrimônio. Emprego estável, casa bonita e quitada, carro novo, mulher que amava. Tudo corria sem os sobressaltos da juventude. Alberto gozava a aposentadoria das aventuras aos 43 anos. Agora se perguntava onde o barco tinha mudado de percurso. Onde?

Ele saiu do banheiro e veio se deitar. Luísa lia um livro de Martha Medeiros que ganhara da irmã. Ele se cobriu com o lençol, deu um beijo em sua cabeça e virou o corpo, como de costume, para a mesa de cabeceira. Ela veio por suas costas, passou a mão ainda gelada pelo ar-condicionado nas costas dele e se aproximou, como que para aquecer-se. Era seu homem. Estivera sempre ali e ela sabia que poderia contar sempre com ele. Alberto virou e delicadamente começou a beijar a esposa. Há duas semanas não faziam amor. O cansaço, um programa interessante na TV, a vontade de ler um livro, uma indisposição, um desencontro, a TPM, a menstruação. Motivos de um lado e de outro que de escasso, ao longo dos anos, viraram rotina. Nada que percebessem de imediato. Eram as circunstâncias. Algo no meio do sexo a fez estalar os dedos mentalmente. Como uma chave elétrica a desligar toda a energia da casa. Algo apagou e ela não sabia onde poderia reparar o defeito. Foram até o final sem que ele visse alguma mudança. Recostaram-se para dormir e ela permaneceu insone. Foram 5 meses até que ela aceitasse e tomasse alguma atitude, mesmo que naquela tranqüila noite, todas as luzes dentro dela já estivessem queimadas.

Ele alimentou por anos a esperança de ser pai. Queria levar o filho aos jogos do Fluminense, queria ensiná-lo a andar de bicicleta, ajudá-lo no dever da escola, contar histórias antes de dormir. Não aconteceu. Se havia algum problema com ele ou ela, não quiseram saber. Jogar a culpa em um dos dois poderia ser o início de uma decepção velada, porém persistente.

Foi ao ginecologista sem avisar o marido. Estava atrasada há duas semanas. Não quis contar antes para não criar expectativas. Dentro de si ela tinha certeza que residia o maior amor de sua vida. Grávida aos 39 anos. Pelos cálculos, Felipe nasceria em novembro, bem perto do aniversário da avó paterna. Sucumbiu com apenas 2 meses de gestação. Alberto nunca mais foi o mesmo.

Ela não o alcançava mais. A perda tinha sido muito maior para ela, claro, mas sofreu em silêncio. Trabalhou mais, estudou espanhol, viajou para todos os congressos e simpósios que podia. Via o marido se afundar no próprio abismo, sem gosto, viço, descrente de tudo. Demorou a voltar ao normal.

Era domingo e Alberto não estava na cama. Luísa estranhou a ausência dele. Levantou e seguiu os ruídos que vinham da cozinha. Ele preparava o café-da-manhã e sorriu abertamente ao ver a mulher ainda com os olhos inchados e a boca seca. O dia nublado daquele outono frio em Porto Alegre era iluminado por ele, que acordara de um pesadelo de 11 meses. Foi assim de um dia para o outro. Reacendeu.

Luísa já não tinha mais as portas abertas. Existia amor nela, no entanto nada que o permitisse entrar novamente. Marcelo surgiu meio que por acaso. Malhavam na mesma academia. Trabalhavam perto. O encontro após o expediente era natural. Da sala de musculação para o motel, esse foi o caminho. Ela começou achando que seria apenas uma aventura para reviver um pouco do prazer próprio, da auto-estima. Se acostumou com as mentiras e passou a ser fria. Perceber-se indiferente à quase tudo a fez entrar no apartamento na noite de 18 de julho e dizer que partiria no dia seguinte. O marido, talvez em estado de choque, não reagiu. Ela ansiava por arroubos de desespero, uma briga antológica e uma reconciliação avassaladora. Teve o olhar perdido de um incrédulo.

Viram-se 3 vezes mais apenas. Todas referentes ao divórcio. Alberto mudou-se para o Espírito Santo afim de nunca mais retornar à Porto Alegre. Luísa ficou mais 3 meses com Marcelo e só aos 50 conheceu o homem que a acompanharia até a morte. Aos 72 anos uma prima comentou quase sem querer que soubera da morte de Alberto. Ele voltara a viver em Porto Alegre, na casa que era de sua família, havia 2 anos. O semblante de Luísa mudou profundamente. Não soube descrever o que sentira.

Sentiu saudade do café-da-manhã aos domingos.
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