sábado, 30 de janeiro de 2010

FLA X FLU


O Fla-Flu nunca morrerá. Está fadado à eternidade. Fará ainda seus torcedores mais fanáticos gritarem daqui há mil anos. Em um mundo cheio de tecnologias, a grama, a bola e o homem ainda serão os motivos de nosso pranto, a razão de nosso ardor. O Tricolor brilhará no infinito! As batalhas que estão por vir, vão traduzir a imensidão de um sonho terno, a mágica de um gol ao fim da partida. O que sentimos neste momento só pode ser relatado por aqueles que vivem o sonho, que amam as três cores da magia. Ernesto Xavier

"O Fla-Flu, já me dizia o meu irmão Mário Filho, o Fla-Flu é um jogo para sempre, não é um jogo para um século, um século é muito pouco para a sede e a fome do Fla-Flu... Começado o Fla-Flu, ele percorreria o tempo dos tempos. Foi uma criação do meu irmão Mário Filho, ele que era o gênio da crônica esportiva, ele era o autor de piadas fantásticas. Ele se lembrou de fazer Fla-Flu, tinha notado que Fla-Flu possuía uma flama, uma trepidação que nenhum outro jogo possuía. Até hoje em todo o mundo não há um jogo que chegue aos pés do Fla-Flu. Que é cada vez mais empolgante. E cada jogo entre o Fluminense e o Flamengo parece ser o maior do século e será assim eternamente." Nelson Rodrigues

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

FIO CONDUTOR


Sigo procurando o fio condutor que me trouxe até aqui. Pode ser que ele não exista e que eu tenha caído de pára-quedas nesta fase da vida. Uma fase de resgates, não de nostalgia. Precisava refazer caminhos, terminar estradas, repensar os limites do meu território, ou então me dar asas e aprender a viver sem limites. Descobri o motivo da busca: tinha voltado a estudar. Isso me trouxe sensações e lembranças tão fortes.

Quando me sinto ultrapassado, estagnado, sem conseguir dar o próximo passo sozinho, me vem a necessidade de estudar. Optei pelo francês. Gosto de línguas novas, pois parecem me levar à lugares que nunca estive e poder sonhar em conhecê-los um dia. E foi assim que voltei a ter frio na barriga antes de uma prova, a rezar pela hora do intervalo, conversar com amigos de classe, me sentir um ignorante vendo a luz no fim do túnel.

Hoje senti, mesmo que em pensamento, o cheiro do biscoito recheado de morango que eu levava para lanchar na infância. Nunca mais encontrei um com aquele cheiro, sabor. Rezávamos antes de comer, uma formalidade para aquelas crianças ávidas por comida e diversão.

Acordar cedo, lutar contra a cama e depois ser vencido por uma voz oculta que me dizia para ser responsável e estudar o máximo que pudesse. Por 4 semanas, 5 dias na semana, 3 horas por dia, foi assim. E como foi bom! Nada supera o descobrimento do novo. Um mundo que se abre em forma de palavras, letras, sons. Eu podia novamente me sentir um pensante, alguém que fazia parte desta dádiva que se chama conhecimento.

Busquei nas gavetas, fotos daquele passado. Fazíamos parte de um mundo particular. Tínhamos nossas regras, gírias, piadas, trejeitos próprios. Éramos não só uma turma, mas uma nação. Naqueles registros vi nossos sorrisos infantis, cheios de esperança. Tínhamos um futuro brilhante pela frente. Ainda com menos responsabilidades, podíamos jurar que nada destruiria aqueles laços. Mas o tempo foi mostrando que aos poucos e naturalmente, outros laços foram se formando e muito daqueles foram se perdendo. Coisa normal da vida. Vamos indo para direções diferentes. Alguns se reencontram pela estrada, retomam o mesmo curso, mas já não somos mais os mesmos. Somos diferentes, outros praticamente. Aquele passado deixado lá trás costuma ser lembrado com mais romantismo. Eliminamos os momentos ruins, fazemos do passado um lugar mais bonito para se viver. Prefiro o hoje, mas não tiro o mérito do que passou. O tempo é amigo daqueles que sabem olhar pra frente sem esquecer o caminho feito para chegar até ali. Por isso ainda procuro o fio que me trouxe até aqui. Quero ser ajudado e não tragado pelo tempo.

Je suis très content maintenant! J’aime ma vie! À demain.

Imagem: RENOIR, Pierre-Auguste

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

SOZINHO NO APARTAMENTO


Se estou sozinho em casa, então porque fechei a porta do banheiro? Precisava tomar banho, mas senti preguiça, resisti durante um tempo. Pareço sempre me portar como se mais uma pessoa estivesse em casa. Fui acostumado a viver em multidão, mas também aprendi a viver com menos pessoas ou sem alguém. Todas as situações tem suas vantagens. Fico bem com todas.

À tarde dormi, não pelo cansaço, mas para sonhar. Tenho a necessidade de sentir outra vida, que não a minha. Às vezes parece melhor. Acordado agora, posso pensar no mundo criado em meus sonhos e pensar que talvez ali possam residir respostas para a realidade vivida.

Recebi uma carta. Não lembrava há quanto tempo isso não acontecia. Escrita à mão. Um carinho vindo de longe, de alguém que nunca vi, mas que já tenho apreço. São de surpresas assim que reconstruímos a alma. Desses pequenos detalhes, quase imperceptíveis que é feito o muro de proteção do meu castelo. Esta firme construção não foi feita de pedras e sim de lembranças. Cada uma, a seu jeito, foi moldando o espaço. Para lembrar quem eu sou, basta olhar atentamente a casa. Ela ainda está em obra. Sou um ser em movimento constante, mas sigo em uma direção indecifrável, porém definida.

Assisto a um filme já começado. Dá para imaginar o que aconteceu nos minutos perdidos. Fui pego pela história, queria saber seu final. Desses românticos para distrair a noite, nada demais, interessante eu diria.

Sei que preciso dormir, mas não sinto sono. Os sonhos da tarde me fizeram descansar também. Agora os olhos não pregam. Sinto preguiça deitado no sofá. Mas lembrei que antes precisava tomar banho. Entrei no banheiro. Se estou sozinho em casa, então porque fechei a porta do banheiro?


Imagem: MUNCH, Edvard.(O Grito)

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

LUA MINHA


Lua minha que habita as noites mal dormidas.

Vela meu sono

quando tudo o mais parece estar acabado,

sem sentido real.


A ti que ilumina os caminhos

de todos que te veneram e admiram.

Faz de mim um lobo uivante,

que suplica pela chance de alcançá-la.


Trocas o dia pela noite,

às vezes se esconde,

mas volta a tornar-se bela

e sorridente.


Lua que me faz vivo,

lua que materializa meus sonhos.

Traz consigo a noite às costas,

feridas cheias de lamentos.


Só a ti mostro meus

olhos em prantos,

a boca em silêncio,

segurando o grito de dor.


Mostre ao guerreiro

que seu escudo é a proteção

Sua luz, a mais bela das dádivas divinas

Suas curvas, o aconchego do lutador.


Dê direção a este

pobre andarilho.

Venha a mim como

uma deusa.


Não permita que

o passado vença o presente.

Traga-me a voz, o sorriso,

o beijo.


quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

BARACK SEBASTIÃO


Neste dia 20 de janeiro, que no Rio é feriado, comemoramos o dia do padroeiro da cidade: São Sebastião. Este que foi um soldado mártir, assim como o outro santo muito festejado na cidade: São Jorge. Diria então que o Rio é uma cidade de guerreiros. Soldados que morreram lutando pela fé cristã. Não vou entrar no mérito religioso, mesmo sendo extremamente simpático aos dois santos citados. Os dois, em diferentes regiões do país, são sincretizados na umbanda com Ogum e Oxossi. Orixás igualmente guerreiros e batalhadores, defensores do bem.

Com a energia deste dia tão importante, Barack Obama assumiu a presidência dos EUA no ano passado. Aquele que foi um dia mágico não só para os americanos, mas para cada negro no mundo. A maior potência mundial estava sendo liderada por um semelhante. Para um povo que sofreu com a escravidão durante mais de 300 anos, que teve um número de homicídios infinitamente maior do que o Holocausto, que sofre com a fome, analfabetismo, descaso, doenças, sem que alguém se mova para ajudar. Quando aquele homem dizia: “Yes, we can!” Ele falava por 2 bilhões de pessoas.

Um ano não é muita coisa e Obama ainda precisa de muito mais do que ser o primeiro presidente americano negro para entrar para a História de verdade. Mas no coração de cada ser que assistiu a posse ao vivo ou pela TV, ele já está marcado. Somente carregado pela energia dos guerreiros ele poderia chegar lá.

A política americana é complicada de entender se tentarmos fazer um paralelo com nossa realidade. Por incrível que pareça, aprovar alguma lei lá é muito mais difícil do que aqui. E diferente da nossa cultura, promover melhorias para os mais necessitados, dando-lhes “vantagens”, como assistência de saúde, não é visto com bons olhos por boa parte da população(republicanos). O nosso SUS é algo de primeiro mundo perto do sistema de saúde americano. Esqueçam seriados como E.R., House, Grey’s Anatomy...aquilo não existe.

Diferente de seu antecessor, Obama não parece tão afeito a guerras sem motivo. Porém se encontra em uma encruzilhada com as duas guerras inúteis que Bush lhe deixou. Acabar com tudo, reduzindo despesas e aceitando o erro americano ou permanecer e tentar consertar? O custo da manutenção das tropas no Afeganistão e no Iraque contrasta com um país com déficit de empregos após a crise financeira mundial.

Espero que Obama assuma o exemplo deixado por São Sebastião: só lutará em defesa de causas justas. A guerra pela guerra não é um ato nobre e sim vandalismo.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

MARIA, ESPERA!


O sertão de Boquira já não dava mais pra viver. Fazia um ano que Maria tinha perdido seu velho Sebastião. Já não tinha mais com quem dividir as tarefas, a angústia, a solidão. Os ossos fracos, a pele enrugada do tempo seco, tudo era árido, inclusive seu coração.
Há 25 anos não via nenhum dos 3 filhos: José, Jorge e Ubirajara. Tinham partido pra tentar a vida no Rio de Janeiro. As cartas de mês em mês e um telefonema nas datas especiais eram a única forma de comunicação dessa mulher de 70 anos. Quando sobrava, mandavam um dinheirinho pros pais.
Vivia porque a morte talvez tenha esquecido dela. Seu tempo já tinha passado, o sorriso já não lhe vinha à boca. A fome já não era mais de comida, mas de vida. Sentia saudade da casa cheia de homens. Seus meninos. Um de 45, um de 40 e outro de 35. Quando saíram de Boquira, no interior baiano, o menor tinha só 10 anos. Chorava por deixar os pais, mas a mãe sabia que ali não existia futuro para eles. Era como se o que restava dela estava sendo arrancado, sem perdão. Entrou em depressão. Só Tião para cuidar dela.
Foram vinte horas de viagem e o peso do mundo em seu corpo de tanta ansiedade. Cruzou o sertão baiano, Minas Gerais, até chegar ao Rio. Nunca tinha saído da Bahia, no máximo uma ida a Feira de Santana, Jequié, Bom Jesus da Lapa. Tinha medo da grandeza da Terra. Não queria se perder.
Estava maravilhada com o tamanho daquele Rio de Janeiro que ela só tinha visto na televisão. Era muito maior do que imaginava. Achou estranho aquele amontoado de casas uma em cima da outra. Como podiam viver assim?
Chegou à rodoviária. Não trazia mais do que uma mala de lona com as poucas roupas que possuia. Nunca tinha visto tanta gente junta. Procurou o rosto dos filhos no meio da multidão. Não achou. Será que tinham mudado tanto? Mas já tinha visto fotos novas deles.
Maria sentou em um banco e esperou. Será que tinham esquecido dela? Ou aconteceu alguma coisa no caminho? O Rio de Janeiro é tão perigoso. Já não dava importância para a fome que o estômago a todo momento avisava. Queria um sinal de rosto conhecido. Tinha vontade de chorar, porém não lembrava como era. Nunca a solidão tinha sido tão forte. Fechou os olhos e ouvia milhares de vozes falando ao mesmo tempo. Tentava lembrar de coisas boas. Quase duas horas já tinham se passado.
Até que Maria ouviu: "Maria, espera!" Abriu os olhos. Não viu ninguém conhecido. Seria ilusão? Girou no próprio eixo a procura daquela voz que a chamou e nada. Nenhum olhar cruzava com o seu. Como se ela fosse invisível aos olhos humanos. "Será que estou morta, meu Deus?"
Neste momento uma mão quente tocou seu ombro. "Vó?" Maria deixou uma lágrima cair e se virou. Madalena, sua neta. Tão parecida com o filho José. Só tinha visto mais nova nas fotos que o filho mandava. Um abraço amigo depois de tanto tempo.
-Desculpa, vó. Vim desesperada pra buscar a senhora.
-Não tem problema minha filha.
-Que bom conhecer a senhora.
-Eu que o diga!
-Peguei um engarrafamento monstruoso pra chegar aqui.
-O que é isso, menina?
-Nada vó, nada. Esperou muito tempo?
-Vinte cinco anos, minha neta. Vinte cinco anos.


Imagem: Matisse, Henri.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

HAITI


Um silêncio que deve ter durado menos de um segundo. Mas um silêncio assustador, daqueles que precedem grandes catástrofes. E então o primeiro estrondo. Debaixo dos pés vinha uma força nunca vista. O mundo estava virando ao contrário. Não tinha como ter noção do que estava acontecendo. Os corpos se debatiam sem que qualquer pessoa pudesse fazer alguma coisa para evitar. Ao redor, pedaços de parede, laje, tudo caía. O que na verdade eram apenas 30 segundos, pareciam horas. O caos fez com que o tempo mudasse seu curso e passasse lentamente, como que no intuito de nos fazer registrar cada instante da tragédia. O famoso “filme” da vida passava diante dos olhos. Será que a hora derradeira já tinha chegado? Lutar pela vida era mais importante.

E então um novo silêncio. Este parece ter durado mais tempo. Mas os gritos e pedidos de socorro ecoaram por todo espaço. Ainda havia vida. Havia também desespero, dor, sofrimento.

Talvez tenha sido assim naquela trágica terça-feira em Porto Príncipe. A única certeza que tenho é da tristeza de um povo que já sofre com tantas outras adversidades, fazendo de seu país o mais pobre do continente americano. Sofrer parece ser o único modo de vida desta população tão miserável.

Há seis anos atrás a seleção brasileira de futebol esteve lá para promover um jogo de paz. Até hoje me emocionam as imagens dos jogadores andando em tanques de guerra e sendo adorados por aquelas pessoas como se fossem deuses. Mas dentro de um lugar que às vezes parece esquecido por Deus, aqueles homens, que se lembraram deles, que se importaram com eles, eram sim deuses. Traziam um pouco de alegria a rostos acostumados apenas com lágrimas.

Vendo as imagens pela televisão é tão difícil entender como mesmo em meio ao caos total, tanta gente ainda lute pela vida. Por que viver em um mundo de fome, dor e descaso? Aí entendemos que a vida é muito maior que tudo isso.

Podemos dizer que em todo o Brasil também iremos encontrar miséria, sofrimento e dor, mas nada pode se comparar a tantos corpos jogados pelas ruas, a total falta de recursos e mantimentos. A importância de uma vida é igual em qualquer parte do mundo. E por isso também devemos pensar e rezar pelo Haiti, parafraseando Caetano. E também pelo desabrigados de Angra, Santa Catarina, Índia, Afeganistão, Iraque, não importa quão distante. Peçamos pela vida, pela paz, pelo amor. E só assim conseguiremos superar tantas catástrofes.

Apesar de tudo, ainda é bom viver nesse mundo.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

SOU TUDO


Sou aquilo que os olhos alheios pensam estar vendo. Sou o que acredito ser e aquilo que tenho a certeza de não ser. Posso ser tudo e sou tudo ao mesmo tempo. Uma estranha sensação de poder, de transformar, de transgredir, de parecer algo, para que tenham de mim a imagem que eu desejar demonstrar. As circunstâncias transformam a minha face, mas não limitam o meu interior, que transcende o tamanho do meu corpo. Sou maior do que eu mesmo. Sou infinito!

Às vezes um tanto infantil. Pode ser culpa da tentativa de um resgate que não é mais possível...tive que crescer, e o que deixei para trás, lá deve permanecer. Não existe volta, apenas resquícios de uma história vivida e enterrada no fundo da imaginação.

Às vezes solitário ou rodeado pelas multidões, porém só. Numa busca pela perfeição dos atos em meio ao caos do universo. Tentando arrumar aquele quarto com os livros espalhados pelo chão e a cama de lençóis embolados no colchão. Sendo o certo das horas erradas, o são na terra dos loucos.

Às vezes matéria bruta, quase xucro, divino pela natureza rebelde. Sedento por aventuras que nunca alcancei, personagem de mim mesmo, querendo ser herói de filme, guardando a surpresa para o final. Um animal a ser domesticado, tendo nas mulheres seu único aconchego.

Às vezes sonhador, imitando Colombo. Imaginando a terra prometida, falando sobre o que ninguém acredita, levando esperança aos que não imaginam o que isso seja. Desvendando mapas sem tesouro, dando direção a vidas sem rumo, a ruas sem saída, a caminhos sem volta.

Às vezes nada. Apenas um homem perambulando pelos espaços vazios do tempo.

Às vezes sim, às vezes não, porém nunca talvez. Gosto de ter a certeza! De aceitar cada erro com a maior das convicções, de não ter idéia do que signifique mais ou menos.

Sou bom e mal, feio e belo, grosso e romântico. Tenho o orgulho de acreditar em cada eu que se apresenta todos os dias. Sou amigo de todos eles e deles tiro minha experiência. Sei ser diferente sem me perder de mim. O pouco que a vida me reserva deve ser suficiente para aproveitar cada renascimento diário, pois sou apenas um espírito que carrega um corpo. Nada me prende.

A alegria por poder ser incomparável me leva a crer que este mundo sem limites soube me ensinar a arte de viver, mesmo sem entender o sentido disso.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

O MELHOR PRESENTE DE TODOS


Eu lembro de uma noite em que já estava dormindo e meu pai veio me acordar. Eu dormia na parte de cima do beliche. Ele tinha acabado de chegar do trabalho, mas possuía nas mãos um presente que ficou marcado por toda a vida. Eram ingressos para o jogo entre Brasil e Uruguai válidos pelas eliminatórias da Copa de 94, em que fomos campeões.

-Ninho, olha o que eu trouxe pra você.

-O que pai?

-A gente vai ver o jogo do Brasil.

-Obrigado, pai.

-Boa noite.

E a partir daí foi uma espera sem fim até que chegasse o dia 19 de setembro. Eu só pensava e falava naquele jogo. Eu ia pisar no Maracanã. Eu ia ver a seleção brasileira. Eu ia ver o Romário fazer gol.

Acabara de completar 9 anos, mas já tinha sido invadido pela paixão futebolística. Meu presente de aniversário tinha sido um uniforme completo de goleiro. Sempre gostei daquela figura que saltava, fazia vôos plásticos, jogava com uma roupa diferente dos demais.

Não lembro o que aconteceu à caminho do estádio, mas a sensação de quando vi o gramado pela primeira vez me é tão nítida quanto as imagens que vejo à frente nesse momento. No corredor para entrar na área do campo, aquela imensidão foi se abrindo. E tinha tanta gente, tantas vozes gritando ao mesmo tempo. Me apaixonei por aquele lugar instantaneamente. Nada poderia me emocionar mais. Mais de cento e vinte mil pessoas trajando verde e amarelo. Aprendi a “ola”. Descobri um patriotismo que só existe pela bola e nunca pelas armas de meu país.

Eu ainda não tinha noção do que era o “Maracanazzo” de 50. Só sabia que Romário estava de volta à seleção e iria me fazer feliz naquela noite.

Só o Brasil atacava naquele dia. Eu via Taffarel fazendo poli-chinelos para não perder o aquecimento. O gol era questão de tempo, mas o primeiro tempo passou em branco. Eu iria ao Maracanã e não comemoraria um gol? O segundo tempo veio e com ele o espetáculo. Cruzamento na área...Romário subiu sozinho e cabeceou para baixo: GOL!!!!!!!! Bem na minha frente. Meu pai me abraçava e levantava no ar. Meu primeiro gol. Chegava perto do fim e Romário recebeu a bola em profundidade. Corria como uma flecha, driblou o goleiro e...GOL!!!!! Lindo! Lindo! Perfeito! O Brasil estava classificado para a Copa do Mundo dos EUA. Não era isso que me importava. Eu tinha pisado no maior do mundo. Tinha comemorado um gol do meu ídolo. Aquele local se tornaria o meu predileto para alegrias e tristezas dali em diante.

Por que me lembrei disso?

Porque sábado eu entrei no sambódromo com uma escola de samba pela primeira vez. O ensaio técnico da Portela, com as arquibancadas cheias, a bateria tocando, todos felizes, sambando, fez de mim novamente uma criança admirada com um lugar mágico. Não importa a idade, sempre nos emocionaremos com o novo.

domingo, 10 de janeiro de 2010

BRISA












-E aí?

-Tudo bem.

-Fazia tempo que não te via por aqui.

-Viajei por uns tempos.

-Foi?

-Tava querendo me conhecer melhor.

-E conseguiu?

-Dei uma boa esfriada na cabeça.

-Que bom.

-E você?

-Eu? Continuei por aqui. Praticamente todos os dias.

-Eu também faria isso se estivesse aqui.

-É bom, né?

-É.

-Mas senti sua falta aqui.

-Sentiu?

-Muita.

-Tenho que ir.

-Volta amanhã?

-Pode ser. Quem sabe?

-Vô tá aqui te esperando.

-Tá.

E ela se levanta. Porém abaixa o rosto e lhe dá um leve beijo na boca e depois sorri. Ele a observa atravessar a pista e depois volta a olhar o mar.

Naquele fim de tarde, com o sol baixo e vermelho, a brisa que batia leve e fria, anunciava o fim do outono. A vida seguia tranqüila e ele tentava não pensar no amanhã.


Imagem: Manet, Edouard.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

NEW YORK


Se entregar a despretensão talvez seja um defeito, porém se olharmos pelo lado da vida caótica em que vivemos, seria um modo de se refugiar na irresponsabilidade, de tirar o peso das escolhas que reside sobre as costas de qualquer homem do século XXI. Mesmo que estejamos tentados a largar tudo e sair por aí sem destino, existem barreiras que nos impedem e assim vamos adiando o dia em que vamos escorregar nem que seja rapidamente para fora dos muros de concreto da cidade. Nem precisa sair da cidade...é só sair da rotina.

Após um momento de stress, resolvi que não iria me deixar levar pela raiva e resolvi entrar no cinema. Claro que com uma tulipa de chopp antes. Não sabia nada sobre o filme: sinopse, atores, diretor...nada. Gostei do título e entrei na sala escura. Minha tia veio junto. Nunca tínhamos tido esse momento tia-sobrinho. Foi muito bom posso dizer. Percebo que muitas vezes não conhecemos quem está do nosso lado. Todos possuem alegrias e angústias, preocupações e vitórias, todos os dias. E poder compartilhar dessas histórias faz de nós seres participantes no universo. Nos dá a sensação de fazermos parte de algo maior e não só de nosso mundinho particular.

Voltando ao filme, ele era tão despretensioso quanto a minha vontade de vê-lo. E assim foi me pegando de surpresa, me prendendo às histórias daqueles nova-iorquinos. Eles eram tão cariocas, tão paulistas, tão chineses...eram tudo. O que dói lá, também dói cá. Bom saber disso.

“New York, I Love You” segue a mesma idéia de “Paris, Je T’aime” onde vários diretores criam pequenas histórias de amor na cidade e assim também mostram seu amor por onde vivem. Tudo costurado por um pequeno fio. Mas o que importa são as vidas passando diante de nós, como se estivéssemos sentados em um banco de praça a observar cada história dos transeuntes. Eu queria continuar sentado naquela poltrona, vendo Nova York pulsar. O ser humano é tão lindo com todos os seus medos e defeitos, amores e olhares.

Deu vontade de fazer o mesmo no Rio. Seria um filme muito mais solar e colorido, é verdade. Porém os sentimentos estariam ali da mesma forma. Palavras e mais palavras a preencher o vazio dos dias, das imagens, dos sons, da vida.

Saí de lá com a certeza de que me entregar ao inesperado pode fazer bem, principalmente quando as regras da vida normal já não nos completam mais.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

LINDA FLOR


A sábia natureza deu às flores o direito de serem belas. Toda flor que nasce, vem para mostrar ao mundo que ainda há esperança de algo novo. Que a beleza irá transformar os corações dos desacreditados. Sábios são os pássaros que as apreciam, se aproximam como que para buscar um pouco daquele néctar mágico, que somente os belos botões possuem. Ali está o constante ineditismo da vida. Nunca será igual o desabrochar de uma nova rosa. Só sabemos que ela será bela. Como? Não sabemos.

Dali sorvemos o amor, da vida sugamos tudo que dela possa nos fazer bem. Como é lindo ver um novo ser, uma nova vida, uma vida inteira.

Seremos sempre botões de rosa em busca do crescimento.

Minha linda flor está por vir. Minha linda flor já é bela. Minha linda flor é minha. É nossa. É do mundo.

Mais sábio ainda é o universo, que dá à Terra seus melhores frutos. Faz de nós presenteados com a magia do inesperado, com a força da luz, com o eterno despertar.

Sei que o mundo pode ser cruel com seres tão delicados. Mas árvores maiores estão ao redor para proteger seus gerânios, hortênsias, crisântemos.

Cuidaremos deste jardim como a nós mesmos. Faremos dele nosso lar. Faremos de nosso peito a fortaleza, de nossos braços o abrigo, de nossa boca o professor, de nossos olhos o vigia, de nossos pés o caminho.

O orvalho do sol já amanhecido nos dará a benção de um santo dia. Linda flor será vida nova, vida vivida, vida toda. Cheia de luz, de cores, de amor.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

TRICOLORES


Em meio a presença de outros loucos como eu, pude perceber que a paixão tricolor nada mais é do que um sentimento sem explicações, que invade nosso corpo, nossa mente, de forma incontrolável. Sabe-se lá porque. Sou mais um fanático que grita, chora, pula, se desespera, mas acredita, persevera. Me apego ao sobrenatural, agarro-me à crença de que algo maior do que eu pode mudar o rumo das coisas. E assim essa paixão vai aumentando. O que recebo em troca? Alegria, êxtase, o direito de sonhar, o prazer da explosão de um gol.

Aprendi ao longo dos anos que amor futebolístico não se mantém apenas com títulos. Se fosse assim, talvez o meu já tivesse cessado. E pelo contrário: cresceu. O futebol é uma parábola da vida, onde lutamos por um objetivo, caímos, levantamos, traçamos metas, às vezes nos decepcionamos, vencemos e mesmo nas adversidades permanecemos em pé, acreditando em dias melhores. E quando o espírito de um time caminha junto aos seus sentimentos, aí está a comunhão perfeita. Time e torcida tornam-se um só. Se um perde, o outro também perde. Se um ganha, acontece o mesmo com o outro. Pois ambos são inseparáveis. Não se consegue distiguir onde um termina e começa o outro. São um só.

Tristes são aqueles que nunca tiveram a chance de extravasar em gritos e lágrimas após um gol. Não sabem até onde pode ir a emoção de um homem.

Como nasce essa paixão? Como ela se perpetua? Porque amamos um time e nunca o trocamos, seja lá qual o for o destino? Quem veste a camisa com orgulho sabe, mas não consegue explicar. Amo porque amo. Choro por que aquilo faz parte de mim. Nada sou sem ele e ele a mim.

Num mar de incertezas, imagino a bola a rolar, a rede balançando, os tricolores a tremularem suas bandeiras verde, branco e grená. Somos uma família. Daquelas cheias de defeitos, mas com um amor incondicional. Somente nós podemos falar mal. Quem vier de fora querendo nos criticar irá levar um sonoro: Não se mete!

Só quem é tricolor entende. Ser tricolor não é fácil. É tarefa para bons e sábios. Pessoas de bom gosto que mesmo diante do perigo, erguem suas cabeças e elevam a moral de seus guerreiros.

Sou um tricolor feliz por estar junto a meus iguais. Uma legião que segue sua falange de lutadores. Tricolores velhos ou novos. Tanto os que viram tempos mais vitoriosos ou os que assistem aos batalhadores, operários incansáveis de hoje. Fazemos parte de um grupo lindo que orgulha a nação. Diferentes nas cores que vestimos, diferentes naquilo que cantamos, diferentes no tamanho do sentimento. Simplesmente diferentes. Inexplicáveis.

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